Voltando ao tema da inflação discutido na coluna da semana passada, a inflação oficial do Brasil encerrou 2022 com variação acumulada de 5,79% -- quase metade da registrada em 2021, que foi de 10,06%. Apesar da queda, não podemos nos acomodar e considerar como condição satisfatória a variação média de preços próximo a 6%.
Dos grupos de consumo que compõem o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), o grupo de Alimentos e Bebidas foi o que mais contribui para a elevação da média de preços na economia. Ao longo de 2022 a variação média de preços deste grupo foi de 11,64%, atrás apenas dos 18% do grupo de Vestuário. Contudo, dado que o peso dos alimentos no orçamento da família brasileira é de pouco mais de 20%, pelo menos 2,3 pontos percentuais da inflação de 5,9% registrada em 2022 vieram de alimentos e bebidas. Ou cerca de 40% da inflação acumulada pelo IPCA no ano passado.
Choque de oferta
Como explicar que o Brasil, um dos maiores produtores agrícolas do mundo, tem na variação de preços dos alimentos o principal componente de inflação? Primeiramente, os preços dos alimentos têm se ampliado por pressões do lado da oferta, e não da demanda.
Esta alta foi consequência da restrição à circulação de pessoas e mercadorias imposta pela pandemia e seus efeitos, desajustando os fluxos de oferta e demanda no mercado mundial. Isso se refletiu na elevação dos preços. Observando a trajetória do preço internacional dos alimentos nas últimas décadas, o índice médio calculado pela FAO para o período 2013 a 2020 se mostrou 23% mais elevado que os preços vigentes antes da crise financeira de 2008, que também provocou salto nos preços médios dos alimentos. Isso claramente demostra que na segunda metade da década de 2010 os preços internacionais dos alimentos se acomodaram em nível mais elevado que o vigente na primeira metade da década de 2000.
Exportação mais atraente
Com a recente elevação dos preços no mercado externo, produtores de alimentos brasileiros são atraídos a canalizar volume maior de artigos para exportação. Isso também tem sido impulsionado pelo real desvalorizado frente ao dólar, favorecendo os ganhos nas vendas externas. Ou seja, com a elevação dos preços internacionais, a oferta de alimentos no mercado interno tende a retrair, até que os preços internos tragam aos produtores rentabilidade semelhante às exportações.
Como o nível das cotações não deve arrefecer de forma rápida no mercado internacional, com chances de se estabilizar em patamar mais elevado que o vigente em meados da década de 2010, o preço dos alimentos tenderá a continuar pressionando a inflação interna para cima. Isso torna evidente que a inflação no Brasil tem componentes estruturais, além dos fatores cíclicos de curto prazo que podem pressionar os preços.
Material produzido por Sandro Renato Maskio, coordenador de Estudos do Observatório Econômico e professor do curso de Ciências Econômicas da Universidade Metodista de São Paulo
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